IMAGEM E PAULO FREIRE NO CONTEXTO DAS FAKE NEWS

 

 

Por que o senhor foi preso?

Porque vocês aprenderam demais.

A leitura do mundo precede a leitura das palavras.

(Paulo Freire)

 

 

No ano em que Paulo Freire completaria 100 anos (em 2021), homenageá-lo depende de nossa capacidade de lermos o mundo que temos diante de nós. Considerando que seu centenário acontece em meio a uma pandemia e em um contexto de desordem informacional¹ repleto de fake news, comemorá-lo é uma oportunidade de recolocarmos as questões referentes à educação nacional, à noção de cidadania e ao projeto de país para o qual atuamos em bases atualizadas a partir do seu legado de uma educação popular crítica e de combate à alienação. Pensador brasileiro mais citado e celebrado mundialmente, Paulo Freire lançou as bases práticas e teóricas de uma educação popular e de uma alfabetização ancoradas na realidade vivida daqueles a serem alfabetizados. Pôs em prática uma educação significativa onde as dimensões epistemológicas, políticas, ontológicas e estéticas estavam integradas e assumidamente trabalhadas de modo indissociável². Freire realizou um projeto de educação onde as questões conteudista e tecnicista não tinham espaço para serem pensadas apartadas do sentido sociocultural e vivido da educação para aqueles envolvidos nela, tanto na condição de professores, quanto na de alunos.

 

 

Assim, comemorar seu centenário, neste século XXI, em meio à ubiquidade das redes digitais de comunicação e às crises democráticas, climáticas e da verdade, permite-nos reencontrar em seus trabalhos pistas que colaborem para recolocarmos as imagens, as tecnologias, a educação popular e o lugar da cidadania na posição de aliadas no enfrentamento dessas crises, e não somente como motores das mesmas. Em uma época dominada pelo digital, pela imagem, velocidade, aceleração e hiperestímulo, qual educação honraria o nosso patrono, comprometido com a emancipação dos sujeitos? Como a educação escolar pode preparar os estudantes para lidar com as imagens, os textos e a linguagem, de modo que eles ainda sejam significativos e apontem para o sonho e a utopia, em vez de se perderem no desvalor da desordem informacional?

 

 

Neste artigo refletiremos sobre as imagens, as tecnologias e a comunicação no trabalho de Paulo Freire –dialogando com os artigos de E. J. Carlos e R. R. V de Alcantara (2017) e V. V. M. Carvalho (2004) – e na dinâmica social contemporânea a partir da linguística e da ciência da comunicação – Saussure (1994) e Bougnoux (1994) –, e analisaremos como o trabalho de Freire pode servir de inspiração para a educação enfrentar as questões das fake news e da desordem informacional a partir do trabalho de C. Wardle (2020) A experiência bem documentada e amplamente citada de Angicos, em 1963, é o dado referencial das reflexões deste trabalho.

 

 

IMAGENS, REPRESENTAÇÃO E A EXPERIÊNCIA DE ANGICOS

 

 

Se entendermos que os profissionais da educação são também profissionais da comunicação, e que o campo da formação educacional deve incluir os conhecimentos da área da comunicação, a reflexão sobre os signos imagéticos e textuais, e sobre os signos como mediadores da relação com o mundo e o conhecimento passam a ser fundamentais para as construções teóricas e práticas das ações educativas. Atualmente, os elementos de uma educação que seja libertadora encontram-se na apropriação dos códigos de nosso tempo, de uma "alfabetização" para os desafios de nosso mundo. Para tanto, o domínio sobre o modus operandi das tecnologias da informação e comunicação e das imagens se faz tão essencial quanto difícil.

 

 

Já em meados do século XX, contudo, apesar de não tematizar teoricamente sobre as imagens e seus usos, Paulo Freire se utilizava tanto de imagens quanto de tecnologias em seu método de alfabetização, sendo um entusiasta das mesmas. Com relação às tecnologias, o sucesso do trabalho em Angicos (1963) pode em grande medida se materializar por conta da ênfase dada aos retroprojetores, na época importados, que chegaram a adiar o início dos cursos de alfabetização. Tal presença, que poderia dar a entender uma ênfase tecnicista, ao contrário, construía no local da aula um ambiente que remetia ao cinema ou à televisão. Nas palavras de Lyra (1996), "a televisão ainda não chegara em Angicos e a imagem do projetor de slides era um deslumbramento" (p. 16), produzindo uma atmosfera de encantamento que, certamente, contribuiu para o processo de alfabetização, dado que, conforme a "anotação de Lyra", "no momento em que é iniciada a projeção, cessam os ruídos. Todos se concentram totalmente na imagem projetada (CARVALHO, 2004, p. 108)".

 

 

"a televisão ainda não chegara em Angicos e a imagem do projetor de slides era um deslumbramento"

 

 

O caráter "audiovisual" da metodologia empregada mostra-se como tendo uma importância básica para os envolvidos na Experiência de Angicos, o que é compreensível tendo em vista a participação de meios visuais no tempo integral da aula (...) onde se registra que "[...] a primeira etapa de cada aula é a projeção da ficha. Essa projeção será a motivação da aula." (CARVALHO, 2004, p. 106).

 

 

A referência ao audiovisual e o paralelo feito entre os retroprojetores e a televisão e o cinema destacam o quanto as mídias e as tecnologias de imagens podem ser aliadas da educação, tanto antes quanto atualmente, devendo ser de domínio e compreensão por parte dos educadores. E Paulo Freire nos serve de exemplo: fez das imagens das tecnologias da época de sua experiência em Angicos (1963) o ponto de partida e a pedra angular de sua prática de alfabetização. Era do diálogo sobre as imagens construídas sobre o cotidiano dos trabalhadores e da gente do campo, e compartilhadas experimentalmente de forma coletiva por meio de projeções, que as "palavras geradoras", utilizadas para alfabetizar, eram produzidas. E essa dinâmica coletiva, síncrona, dialógica e compartilhada buscava garantir um maior enraizamento e ancoragem àquelas imagens que já representavam e se referiam à vida local.

 

 

Freire pratica, então, uma "pedagogia pela imagem" (Carvalho, p. 100). O Programa Nacional de Alfabetização, elaborado em 1963, continha um diafilme (tira de filme de 35 mm, em geral constituída por uma série de fotogramas, que projeta imagens fixas) com imagens do artista plástico Francisco Brennand, além de "situações de aprendizagem que introduzem as palavras geradoras, o desdobramento delas e a formação de novas palavras e pequenas frases (Diálogos com Brennand, s/p)." Desta forma, o processo de alfabetização (e de conscientização) se dava a partir das imagens e palavras geradoras (também projetadas), sendo as mesmas, parte fundamental do método de Freire.

 

 

Iniciar a alfabetização com leitura de imagens permitia que alunos que não dominavam os códigos do texto pudessem produzir discurso a partir de imagens que representavam sua própria realidade, de forma visível, real. O domínio da palavra inicia-se, em Freire, então, por "imagens geradoras" que garantem níveis de significação aos temas e palavras que são levantados entre os educandos, permitindo que, através da imagem, "a representação de coisas familiares do universo cultural dos educandos [leve] aos símbolos fonéticos gráficos e à sua concretização, em um processo de transcodificação". Vicente Carvalho chama a isso de processo Ideovisual, segundo o qual a aprendizagem da linguagem escrita se dá pela identificação visual da palavra.

 

 

Autonomia linguística e simbólica, alfabetização e desordem informacional

 

 

Em certa medida, toda reflexão e toda prática da área da comunicação social passam por compreender os mecanismos e as lógicas envolvidas nos atos de representação, mais precisamente nos atos de significação. Como os signos funcionam e como servem para representar e comunicar o mundo, nossas experiências e conhecimentos sobre ele são a chave para pensarmos sobre critérios de verdade; sobre a confiabilidade e a responsabilidade das mensagens, dos emissores e das comunicações; sobre as possibilidades de apreensão, compreensão e compartilhamento do mundo e; também, sobre as sensibilizações e fruições autorizadas, valorizadas e não-utilitaristas dos nossos corpos, gestos e gostos3. Um signo, qualquer que seja ele, terá uma estrutura triádica: significante (sua dimensão sensível e material), significado (seu sentido) e referente (a dimensão externa ao campo semiótico, simbólico ou discursivo ao qual o signo se refere). Contudo, no caso do signo linguístico, segundo Saussure (1994), este poderia abrir mão do referente externo à língua e se tornar autorreferente ou ter como referência as próprias construções e sentidos produzidos pelo discursivo e pela estrutura semântica e sintática da língua.

 

 

E. J. Carlos e R. R. V de Alcantara (2017) exploraram amplamente essa relação semiótica, epistemologia e educação em seu artigo Freire e o uso pedagógico da imagem visual na alfabetização de jovens e adultos, onde apresentam a questão em termos de "circuito gnosiológico": experiência-problematização-narrativa. Eles destacam o quanto a Educação Popular, para ser significativa e gerar transformação social, precisa entender e contar com uma ancoragem do discurso na experiência, de modo a garantir uma reflexão crítica sobre a realidade vivida, que possibilite tanto a tomada de posse simbólica da mesma, quanto uma tomada de posse existencial que permita que uma transformação material e concreta da realidade também se dê.

 

 

Freire, com seu método de alfabetização e na experiência de Angicos, tentava fazer com que o texto, os símbolos e as palavras não escapassem em uma pura deriva desmaterializada sem contato com a realidade. Deriva que, por vezes, faz da alfabetização um processo mecânico de domínio do código línguístico-alfabético sem sentido de mundo, em vez de um domínio do mundo com o auxílio do código linguístico-alfabético. A compreensão e o domínio da independência do símbolo textual, do símbolo linguístico, em ralação ao referente material externo à língua é uma característica da humanidade que responde por nossas capacidades de sonhar, produzir arte, cultura, imaginar, performar e projetar mundos possíveis. Contudo, a experiência dessa desvinculação sem a devida compreensão e domínio da mesma pode levar a uma troca de informações vazias; à impossibilidade de comunicação; ao niilismo na comunicação e na simbolização do mundo; à perda de sentido; à produção de mundos que em nada dialogam com a realidade material, corporal e sensível que engendra nossas vidas cotidianamente, quer tenhamos consciência disso ou não. Sem conexão com o mundo, a linguagem, a comunicação e as trocas simbólicas podem deixar de servir como potenciais transformadores da realidade, para funcionar como poderosos alienadores da realidade. E o combate à alienação é central no pensamento pedagógico de Paulo Freire.

 

 

"Freire, com seu método de alfabetização e na experiência de Angicos, tentava fazer com que o texto, os símbolos e as palavras não escapassem em uma pura deriva desmaterializada sem contato com a realidade. Deriva que, por vezes, faz da alfabetização um processo mecânico de domínio do código línguístico-alafabético sem sentido de mundo, em vez de um domínio do mundo com o auxílio do código linguístico-alfabético."

 

 

É a partir da radicalização dessa deriva, que se torna perdição e devaneio, que buscamos entender em parte o que vivemos atualmente no que se refere à desordem informacional que se desenvolve no contexto de um ecossistema de informação. Essa desordem responde tanto pela proliferação de fake news quanto pelo fato de elas não serem fáceis de identificar, nem o único problema a ser enfrentado nesse ecossistema informacional.

 

 

 

O discurso e a identificação da vigência de um cenário de pós-verdade denunciam o quanto a incompreensão da independência dos signos frente a uma dimensão não linguística pode fazer com que a questão da verdade, a questão de se buscar um referente, um critério de validação não-discursivo para o discurso, ou mesmo um critério em esferas discursivas, seja completamente abandonada ou tome um caráter pessoal e individualizado. Sem que a questão do critério com regras estabelecidas e instituídas esteja presente, tudo passa a poder ser dito, em qualquer lugar, a qualquer hora e em qualquer contexto. O que se diz passa a ter legitimidade única e exclusivamente pelo fato de ser dito e pela intensidade quantitativa e efusividade estética com que é dito, não mais por critérios qualitativos rigorosos. A análise do discurso perde a razão de ser e o interesse, e cada indivíduo passa a aderir aos discursos como sendo verdadeiros a partir de valores próprios que não são jamais colocados à prova ou para análise. Sua legitimidade estaria blindada ao escrutínio qualquer que seja ele4.

 

 

Esse curto-circuito, esse emaranhamento das hierarquias5 que as bases de qualquer critério de validação dos discursos devem exercer, tem impactos não só no que se refere à verdade, à dimensão epistemológica, mas também naquelas ético-políticas, ontológicas e estéticas, de modo que afirmar uma pós-verdade se faz sobre pena de se afirmar, também, uma pós-ética política, uma pós-ontologia e uma pós-estética. Ou seja, sem a verdade, nem o poder e o valor, nem a vida e o ser, nem os afetos e as sensibilidades fazem mais diferença ou merecem ser pensados, questionados e refletidos na ordem da regra, da instituição e da ordenação de um coletivo composto por múltiplos interesses.

 

 

O cenário da pós-verdade é o da individualidade absoluta e o da não-humanidade, posto que a sociabilidade, a cultura, a arte e o simbólico perdem a construção arbitrária, mas coletiva e convencionada que garantiram a comunicação e essas construções que são as marcas da humanidade até aqui. O desregramento coletivo do simbólico, a incompreensão ou abandono de um critério referente da significação do signo coloca seu funcionamento em crise, de modo que os significantes possam se unir a qualquer significado pelo exercício da força, aliando-se com facilidade a construções simbólicas distópicas, conflitantes com um projeto humanitário e libertário. Como pensar a educação nesse cenário?

 

 

Escola, referência territorial e utopia

 

 

Paulo Freire e seu compromisso coma a referencialidade da alfabetização e a ancoragem da educação popular em experiências que garantam a reflexão crítica sobre a realidade vivida nos fornecem pistas que parecem valiosas.

 

 

O deslocamento provocado pela representação (pintura/desenho) é transformador e redentor, devolvendo aos participantes dos Círculos de Cultura, por comparação e contraste, a potência que lhes é própria. Freire construiu um método de alfabetização ativo. Afirma o autor:

 

 

[...] pensávamos numa alfabetização que fosse em si um ato de criação, capaz de desencadear outros atos criadores. Numa alfabetização em que o homem, porque não fosse seu paciente, seu objeto, desenvolvesse a impaciência, a vivacidade, característica dos estados de procura, de invenção e de reinvindicação (FREIRE, p. 1974, p. 104).

 

 

"Se a educação é uma das chaves, senão a chave para a construção de humanidade como coletivo-sociocultural e simbólico, é preciso que ela redobre a atenção em se manter ancorada e em ser mecanismo de ancoragem coletiva, ser solo territorializador do discurso e da formação humana."

 

 

Vivemos numa cultura de imagens – a possibilidade de resgatarmos a dinâmica e as intenções do método de Freire pode mostrar-se potente para nossos dias e para alunos que são, em geral, jovens, desinteressados pelos processos convencionais de ensino. O método freiriano encarna elementos de uma educação estética, uma educação que resgata o significado da experiência do aprender e ensinar, ampliando seus objetivos para além da dimensão cognitiva da educação, da dimensão técnica do transmitir e da dimensão fechada do espaço escolar.

 

 

Essa dinâmica demonstra que Paulo Freire trabalha com uma concepção ampliada do que seja educação. Atuando no espaço de vida dos próprios educandos, construindo seu material a partir do universo de palavras dos próprios estudantes, Freire entendia a educação como algo que envolve a incorporação e indissociação de educação e mundo, a partir da inclusão de elementos significativos do universo dos educandos.

 

 

Se a educação é uma das chaves, senão a chave para a construção de humanidade como coletivo-sociocultural e simbólico, é preciso que ela redobre a atenção em se manter ancorada e em ser mecanismo de ancoragem coletiva, ser solo territorializador do discurso e da formação humana. E nisso as escolas são dispositivos importantes e privilegiados, uma vez que são por si e em si materialidades territoriais espaço-temporais bem delimitadas. Um solo de experiências coletivas ao qual todos possam se referir e com o qual possam se identificar como indivíduos e como membros de coletivos. Do solo espaço-temporal da escola, das experiências síncronas partilhadas em seus limites e delimitações, significantes, sentidos e referentes – ou seja, os signos em sua tríade – podem ser partilhados, compartilhados, negociados, regrados, convencionados em comunhão. De modo que os critérios sejam construídos no coletivo e permitindo o escrutínio, a reflexão e a crítica sobre seus efeitos de sentido e sua significação. Nesse aspecto, a escola tem potência para ser espaço e tempo de resistência à pós-verdade em seu risco pós-humanitário, ser um território onde é possível fincar os pés e voltar a dominar a liberdade simbólica na direção de utopias coletivas, inclusivas, solidárias e empáticas.

 

 

Notas

 

[1] O conceito de desordem informacional é desenvolvido por Claire Wardle (2020) para designar o contexto de fluxo, manipulação, produção de desinformação, mesinformação e malinformação que as conexões entre humanos, máquinas e redes sociais digitais têm produzido. Ainda segundo a autora, trata-se de um ecossistema informacional, poluído e desordenado, onde cada vez mais é mais difícil de se produzirem comunicação e informação confiáveis e de qualidade, e onde o termo fake news já quase nada esclarece ou nomeia adequadamente, sendo um problema menor frente a tamanho quadro de desordem.

 

[2] Esta indissociabilidade entre essas dimensões será mais bem apresentada posteriormente, mas se deve ao fato de Freire partir da realidade vivida dos educandos para construir as imagens e inspirar as palavras geradoras utilizadas para alfabetizar. Eram as discussões e reflexões sobre o cotidiano que serviam de referência para o discurso a ser representado linguisticamente pelo código escrito. Assim, o conhecimento era construído com base na realidade dos educandos, garantindo uma referência ontológica para a construção epistemológica. A reflexão crítica e coletiva sobre as situações vividas e a representação das mesmas em imagens a serem projetadas incluíam e articulavam as dimensões ético-políticas e estéticas, ou seja, um modo de entender e se apoderar do mundo; e se conduzir nele andava de par com a geração de imagens e modos de expressar e ver esse mundo.

 

[3] De modo um pouco diferente, buscamos aqui, novamente, listar como as questões envolvidas nas esferas epistemológicas, ético-políticas, ontológicas e estéticas estão relacionadas e se desdobram umas das outras.

 

[4] A velocidade e ubiquidade das relações por redes sociais digitais faz com que vivenciássemos o discurso escrito e imagético como se fossem fenômenos da fala, escapando da estrutura da língua que mantém a referencialidade interna à língua sob controle e algo referida ao pensamento e a convencionalidade cultural. "Três características marcam a língua em sua diferença com a fala e em sua arbitrariedade. Primeira: ela seria a parte social da linguagem. Seus signos e seu funcionamento estrutural seriam estabelecidos única e exclusivamente por uma "espécie de contrato estabelecido entre os membros da comunidade" (Saussure, 1994, p. 22). Assim, nenhuma atitude individual pode criar ou modificar a língua. Segunda: ela seria o que haveria de essencial na linguagem: sistema homogêneo, "que conhece somente sua ordem própria" (Saussure, op. cit., p. 31), formado por signos compostos pela associação de um sentido (significado) a uma imagem acústica (significante). Terceira: sendo um sistema de signos estabelecido socialmente, ela é sempre anterior ao indivíduo, que a registra passivamente e não pode alterá-la de modo algum. Em contrapartida, à fala caberiam: o aspecto individual da linguagem, sua porção "acessória e mais ou menos acidental" (Saussure, op. cit., p. 22), onde uma volição combinaria os signos para expressar os pensamentos específicos de cada indivíduo." (MONTEIRO, A. V., 1998, p. 52)

 

[5] O conceito de hierarquias emaranhadas é apresentado por D. BOUGNOUX (1994) quando a discussão de uma desordem ou impossibilidade da comunicação em um modelo orgânico e expressivo já aparecia no campo teórico da comunicação. Esse modelo orgânico expressivo seria semelhante ao ecossistema informacional descrito por Wardle (2020), onde a desordem informacional imperaria.

 

 

Referências

 

ARRAIS, D. Educação para adultos. In: Dont touch my moleskine. 23 nov. 2010. Disponível em: http://donttouchmymoleskine.com/educacao-para-adultos.  Acesso em 18 jan. 2022.

 

BOUGNOUX, D. Introdução às ciências da informação e da comunicação. Petrópolis: Vozes, 1994.

 

CARVALHO, V. As imagens no Método Paulo Freire na experiência de Angicos (RN) – 1963. Educação em Questão, Natal, v. 21, n. 7, p. 98-115, set./dez. 2004. Disponível em: https://periodicos.ufrn.br/educacaoemquestao/issue/view/475.Acesso em 18 jan. 2022.

 

FREIRE, Paulo.Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

 

FREIRE, P, GUIMARÃES, S. Educar com a mídia: novos diálogos sobre educação. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

 

LYRA, C. As 40 horas de Angicos: uma experiência pioneira de educação. São Paulo: Cortez, 1996.

 

MONTEIRO, A. V. Da representação à simulação: comunicação e conhecimento. Rio de Janeiro: UFRJ, 1998. (dissertação de mestrado).

 

Diálogos com Brennand. In: VI Fala homenageia Paulo Freire. Disponível em: http://vifalahomenageiapaulofreire.blogspot.com.br/p/dilalogos-com-brennand.html. Acesso em 18 jan. 2022.

 

SAUSSURE, F. de. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 1994.

 

WARDLE, Claire. Guia essencial da FirstDraft para entender a desordem informacional. FirstDraft, jan. 2020.

 

 

 

Aline Monteiro

 

Doutora e Mestre em Comunicação e Cultura pela ECO/UFRJ. Professora Adjunta de Psicologia da Educação da Faculdade de Educação da UFRJ. Desde 2016 é Diretora da Divisão de Ensino da Pró-reitoria de graduação da UFRJ

 

Angela Medeiros Santi

 

Doutora em Filosofia, pela PUC/RJ. Professora Associada de Filosofia da Educação, na Faculdade de Educação/UFRJ.