DESAFIOS DA EDUCAÇÃO E A PROFISSÃO DOCENTE

 

 

Depois de quase dois anos letivos inteiros sem aulas presenciais, por contada crise da Covid-19, grandes desafios se apresentam à educação em 2022. Afinal, com a baixa conectividade, falta de equipamentos e livros em domicílios de alunos oriundos de famílias vulneráveis, ocorreram não somente perdas de aprendizagem na educação básica, como também o aprofundamento das desigualdades educacionais já existentes.

 

 

O cenário nas escolas públicas, onde estudam cerca de 81,4% dos alunos de educação básica, foi bem desafiador. Apesar da vacinação dos professores, com duas doses, o que poderia permitir uma reabertura segura das escolas no início do segundo semestre, muitos prefeitos, na falta de uma coordenação nacional da resposta educacional à Covid-19, não fizeram os investimentos necessários na infraestrutura das escolas ou na necessária contratação de professores. Isso retardou ainda mais a volta ao presencial.

 

 

É nesse contexto que a atuação docente se torna mais desafiadora. Depois de ter de lidar com aprendizagem remota, os mestres precisam, ao mesmo tempo, acolher alunos desengajados da escola e, ao mesmo tempo, construir uma forma de recomposição das aprendizagens perdidas. Afinal, as avaliações diagnósticas vêm mostrando lacunas expressivas na aprendizagem de todos.

 

 

 

 

Para tanto, há que se organizar um processo sólido de formação profissional dos professores para este desafio que se soma aos que já existiam antes da pandemia. Mas não faz sentido pensar em fazer isso apenas em cada escola pública, com os recursos de que elas dispõem. Vivemos numa sociedade em rede e os sistemas públicos de educação também podem se beneficiar de uma atuação colaborativa entre unidades escolares.

 

 

Daí a importância da Escola de Formação Paulo Freire, que tive a honra de inaugurar, como secretária municipal de Educação do Rio, em maio de 2012, com a presença da viúva do grande educador, a Ana Maria Araújo Freire. A escola tem a função de coordenar o processo de formação continuada em serviço dos professores da cidade, em articulação com as unidades da Secretaria responsáveis pelo processo de ensino.

 

 

Menos de um ano depois do centenário de Paulo Freire e nos 10 anos da Escola, certamente há muito que celebrar, mas, mais ainda, como vimos acima, desafios antigos e novos a serem enfrentados. Isso é particularmente importante numa cidade com tanta desigualdade social e educacional, com escolas situadas em áreas conflagradas e, dado o tempo de existência da rede, um fluxo constante de professores se aposentando e novos entrando tanto na Educação Infantil quanto no Ensino Fundamental.

 

 

“Vivemos numa sociedade em rede e os sistemas públicos de educação também podem se beneficiar de uma atuação colaborativa entre unidades escolares.”

 

 

Neste ano de 2022 teremos que preparar os docentes para tornar a equidade uma obsessão e enfrentar a crise de aprendizagem que acometeu a todos, mesmo que de maneira desigual. Para tanto, precisamos estruturar um sistema sólido para recompor as aprendizagens perdidas, ao mesmo tempo em que avançamos na implementação da Base Nacional Comum Curricular que, apesar de prevista na Constituição, o Brasil levou tanto tempo para elaborar e converter em currículos estaduais e municipais.

 

 

 

 

Afinal os países que contam com bons sistemas educacionais contam com currículos nacionais. Só com uma definição clara do que se deve aprender, podem-se assegurar direitos de aprendizagem para todos, como estabelece o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4, de que o Brasil é signatário. Será necessário também formar os mestres para trabalhar com dados de aprendizagem, construindo uma educação com base em evidências e sem negacionismos científicos em educação, como nós defendemos que ocorra na saúde. Valerá certamente o esforço, afinal, somos o 12º país em PIB e não podemos pensar pequeno.

 

 

É bom lembrar também que completamos neste ano 200 anos de independência e que soberania nacional se concretiza com uma sociedade coesa, educada para a autonomia e para a cooperação na solução dos problemas complexos que teremos que enfrentar neste século.

 

 

 

Claudia Costin

 

Claudia Costin é fundadora e diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV CEIPE), Rio de Janeiro. Foi Diretora Global de Educação do Banco Mundial, membro da Comissão Global sobre o Futuro do Trabalho da Organização Internacional do Trabalho (OIT), professora da PUC-SP, do Insper, da Enap (Canadá) e, mais recentemente, da Faculdade de Educação da Universidade de Harvard. Foi ministra da Administração e Reforma do Estado, secretária de Cultura do Estado de São Paulo e secretária de Educação do município do Rio de Janeiro. É articulista da Folha de São Paulo e cofundadora do movimento da sociedade civil, Todos Pela Educação. Integra, desde o final de 2020, o UIL - Instituto para Aprendizagem ao Longo da Vida - Institute for Lifelong Learning - da Unesco e o Conselho Administrativo da Qatar Foundation.